segunda-feira, 21 de abril de 2008

Tirado do baú...


Vazias, dispostas sobre a mesa, as canecas traziam lembranças do tempo em que cada uma tinha um dono.
A bege do filho, a cinza da filha mais velha, a verde do enteado...
Ele tinha escolhido para si a amarela, porque disfarçava o conteúdo habitual: chá. Odiava chá, mas toda noite enfiava a bebida goela abaixo, para cumprir o ritual familiar. (Sempre sonhara em ter uma família perfeita).
A da mulher era a laranja, mesma cor da camisola que viu jogada num canto ao abrir a porta do quarto e deparar com a ela nuazinha na cama com o enteado, numa tarde qualquer em que tinha voltado para casa mais cedo.
Eles tinham ido embora, mas as canecas estavam impregnadas de passado. Encheu a sua de pinga e tomou num só gole, para afastar as cores. Um arco-íris borrado foi a última coisa que viu antes de se debruçar sobre a mesa e chorar.

Um comentário:

evao do caminhao disse...

simples e excelente... como as canecas!