sábado, 3 de maio de 2008

Isabela, a menina que não deixam morrer

Nem sendo atirada de um sexto andar, a garota tem o descanso que mereceria caso não pertencesse a uma família de classe média, não fosse branca, não tivesse madrasta, não surgisse providencialmente para preencher os buracos deixados na imprensa pela mesmice que assola o país. Buracos iguais aos da rede pelos quais o corpo voou como o de uma Ismália contemporânea, sem a loucura daquela.

Abriu-se a brecha e jogou-se a menina na vala, mas não para descansar... para apodrecer viva por conta de tanta exposição patrocinada por uma mídia refinadamente sádica. Não se sabe indicar a pior, mas sem dúvida a emissoa mais cruel foi a Record, que no dia da "reconstituição" do crime transmitiu tudo em ritmo de partida de futebol.

O jornalista, um minigalvãobueno, insistia o tempo todo que o gol seria marcado logo, ou seja, que o boneco, símile do corpo da menina, seria atirado "a qualquer momento". E com esse bordão, dito no ritmo de quem transmite passes de Pelé, ele segurou a audiência por umas 4 horas.

Até que foi marcado o gol: o corpo foi "lançado", embora com amarras, do sexto andar do prédio.

Preenchida em seu vazio dominical pelo descomunal pênis da crueldade, do desrespeito, da sede de audiência, a platéia foi penetrada aos poucos e deve ter gozado muito quando, finalmente, a Isabela-boneco foi jogada pelo buraco da rede.

Só faltou o grito de gol.