segunda-feira, 22 de outubro de 2007

A antialquimia: transformando ouro em bosta

Pois é... há algumas décadas surgiu o Faustão.
Era um gordo engraçado, inteligente, criativo, que comandava o Perdidos na Noite, na TV Record. Programa divertidíssimo, com espaço para a marginália da época.
Foi engordando cada vez mais e ficando cada vez mais sem graça...
Aliciado pela Globo, virou aquela meleca, mistura pastosa de showman com Camisaria Colombo.

Sem graça - mas se supondo um Chaplin -, sem vocabulário - mas se achando um erudito -, sem ginga - mas se considerando um Fred Astaire -, o pacote flácido navega ainda pelas tardes de domingo numa demonstração de que redundância é mesmo o que dá certo: "ô loco!", expressão roubada da fala tão espontânea do interiorano virou frase ridícula porque veiculada pela boquinha melada do Pantagruel global (vocês já notaram que ele tem os lábios sempre úmidos? Seria gloss ou é cuspe mesmo?); as pegadinhas de dez ou mais anos de idade fazem lembrar o início do VHS: show de chuvisco; a gozação nada sutil e extremamente deletéria em cima de gays... enfim, o esperado, repetido ad nauseam, para gáudio de um público que espera o mundo acabar em barranco para ter onde se encostar.

Pois bem: para chacoalhar a placidez domingueira, surgiu há pouco o Pânico na Tevê.
Oba! Esperanças no horizonte!
Criativos, os rapazes costumavam constranger famosos com suas brincadeiras nem sempre rigidamente pautadas pelo bom gosto, inventar situações efetivamente engraçadas... E dá-lhe criatividade! A dinâmica do programa, embora lembrando bastante aquele inaugurada por Chacrinha algumas décadas antes, era divertida, cheia de novidades verbais e visuais, o escracho era a cara do Brasil mais criativo... enfim, altíssima taxa de informação.

De repente - como ocorreu no último domingo - temos 4 minutos de programa e 5 de publicidade. Marcados no relógio, pois sim? O barco começou a naufragar... A puta se casou com o industrial, não admite mais que se fale em esquina, parou de chupar e virou dama. Agora só Igreja N.S. do Brasil pra ela. Ah, na missa das 11, que é a chique.

Não se trata de hipocritamente propagar a baboseira de que criatividade não combina com lucro. Artista tem mais é que ganhar bastante grana mesmo, especialmente se é criativo. Como jogador de futebol, que não se forma em escola.
Mas o que tá ocorrendo no Pânico, peraí!
Ninguém é trouxa! O programa perdeu a graça, perdeu a verve, perdeu o sentido, exatamente porque ganhou sentido no contexto escroto da mídia.
Comprometido com tantos anunciantes, certamente o raio de ação dos meninos antes tão criativos vai-se restringir. Se a esposa do dono da indústria X, anunciante, for uma cafona de marca e estiver na mira dos humoristas... não vai mais acontecer nada, né? Ou vai?
E a dondoca que detém poder sobre o industrial tal, que tem uma cota do programa? Vai ser objeto de gozação? Claro que não, seu João!
E a Globo... ninguém detona um possível futuro lar, né?
Além da liberdade restrita, o program virou uma grande vitrine de produtos - fato que já não mais suporta a dinâmica original do palco - e cai no dèja vu. Quer apostar que logo, logo o Pânico estará com novo visual, comportadíssimo, pra poder acomodar os anunciantes?
Uma pena? Sim, é um pena. Não porque eu os ame. Apenas não vejo agora a menor graça no programa. Já, já o público começa a desligar a televisão na hora do programa.

Tomara que o grupo entre em pânico. E não saia mais.
Bem feito.

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Mais um feriado

Um dia, aquele Papa-voador, o João de Deus, resolveu vir ao Brasil matar seu tédio vaticano, foi até o Santuário de Aparecida - coisa que o povo Brasil faz com a facilidade com que se diz "água" - e pronto: virou feriado. Eu tenho certeza de que ele comparou a cúpula da catedral com a da capela Sistina e revirou os olhinhos romanos, entediado com a cultura kitsch, sem saber que no Brasil o Juízo Final não fica no teto da capela, mas na rua, fora da igreja.
Enfim, não se sabe muito bem se 12 de outubro é comemoração da visita do Papa ao Brasil ou dia da Santa, aquela. Afinal, foi a primeira vez que a Santa foi honrada com a visita do Papa!
Uai, por que tanto espanto? Eu acho que o espanto se justificaria se a coisa fosse ao contrário: a Santa aparecendo pro papa e não este aparecendo pra aquela. Porque santo há de ser, hierarquicamente mais mano de Deus que Papa, né? Ou não? Sei lá, mistérios da fé.
E quem há de entender a hierarquia da Igreja Católica, esta gorda e decrépita senhora que dia-a-dia vem sendo currada pelas artimanhas e pirotecnias da Igreja Universal, esta sim repleta de fogos e festas?
Bem, o motivo do feriado não é certamente o Dia da Criança. Talvez seja o dia CONTRA a criança. Sim, porque o filhotinho de brasileiro já vai crescendo com a idéia de que feriado é bom especialmente pra emendar. E nem quer saber o porquê do feriado. Basta que o seja, pra encher o carro de tranqueira e pegar estrada. Aí o já esperado: bebida em excesso (não se vende cerveja em bares de estrada, mas quem precisa?), velocidade em excesso, onipotência em excesso... e pronto. Nego vira estatística ou se estropia todo. Tudo pra beber uma caipirinha à beira-mar... mirando os cocôs que singram os verdes mares bravios da minha terra natal, que também a prefeitura das cidades litorâneas não é de ferro pra ter de se preocupar com cocô de turista, ora tenha paciência.
Essa redundância cansa. Lembra Chico: "Todo ano eles fazem tudo sempre igual..."
Daqui a pouco tem ainda o feriado do Finados (agora virou moda visitar o túmulo do defuntão ou da defuntona - melhor esclarecer pra não me acusarem de preconceito de gênero - na véspera, botar a florzinha ali rapidinho pra viajar logo cedo no outro dia... "Deixamos papai em paz na sua campa, não é Kleverson? "), depois tem a proclamação e em seguida, o dia da consciência negra, em que Zumbi ressurge glorioso, sem qualquer trocadilho com a Glória Maria.

Feriado cansa. Quando passar o cansaço, vou fazer minha mala pra pegar a estrada.